sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

O meu menino jesus chegou

Era perto da meia-noite, a chaminé fumegava, o sapato estava a preceito, a musica tocava lá no fundo… bem baixinho. Eu, criança, esperava que algum sorriso viesse pela chaminé.
Chegou.
Chegou sem ser esperado.
Esperado? - Não! Nem um pouco.
O sino tocou no quarto. Fui ver. Estava frio. Foi engano.
Alguém, Ele, Esse Alguém, tinha por engano tocado na campainha errada. Até porque já se tinha anunciado umas horas antes.
Não…
O sino tocou mesmo! Resplandeceu de brilho de uma noite de natal. Noite de natal, em que está proibido proibir.
Noite de natal, onde o mundo parece diferente.
Noite de natal, onde o mundo e as mentes estão abertas a aceitar sonhos e dúvidas.
Tilintou e olhei para a roupa ainda quente, ali tão perto.
Estás proibida de proibir, ainda que por uns instantes.
Foi fácil, ela ainda estava quente, a noite estava fria...
Estava frio, mas o suor escorria pela fronte, ainda em dúvida se ele tinha mesmo tocado.
Mas como é noite de natal e na noite de natal o mundo é melhor e cheio de sonhos…
É loucura? – É! Mas não tenho eu o direito à loucura? Ainda que seja na noite de natal?
Sim. Tenho!
Corria riscos?! – Sim corria. Os mesmos riscos corridos há meses atrás, numa partida de xadrez. Esses tinham sido combinados ao pormenor, medidos, questionados, acordados…
Estes não! Mas eram sabidos, logo mais exigentes e menos desculpáveis, mas mais imaginários, porque tudo era, ainda, imaginação.
Mas o sino tocou... Tocou e fui atrás daquele fio de melodia que somente chegava a meus ouvidos.
Onde?
No lugar do costume, ouvi dizer do fim daquele fio melodioso.
No lugar do costume! Estou só. Eu e o mar que bate nas muralhas como que a prolongar os muitos sussurros, choros e risos. Ele, o Pedro, tinha-me dito: “Andas à procura de amor no sítio errado”.
Saboreei a tua chegada ou simplesmente olhei-te com olhos de luar, somente aqueles que te conhecem…
Que fazer?
Não tive tempo. Fui enlaçada docemente, com um sabor a mel, só possível porque era noite de natal. As tuas mãos grandes, enormes, rodearam-me a cintura, como que querendo sentir que eu era de verdade, mãos que pareciam conhecer bem as marcas do meu corpo.
Senti-me pequena, quase partida a meio.
O banco do jardim estava coberto pelas lágrimas do céu.
Foi tudo tão real, tão nítido, tão objectivo e… tão sonhado, tão mítico, tão idílico, que surge o medo de que aquele momento se estilhassasse e onde o espelho da alma estava prestes a nublar.
Foram horas de trocas, de sensações, de toques, de carícias, de olhares, de sonho, onde vi na tua boca bem traçada, a linha do horizonte, e onde fui beber o ouro da tua fonte.
Perguntei-te se gostavas de dançar. Respondeste dormindo, que sim e...que gostavas muito de mim.
Beijaste meu corpo de pedra quente e marfim, mais quente que o sol tropical, com boca e língua de maresia.
Foste o meu menino jesus.
Negaste.
Reafirmei. Voltaste a negar.
Pediste desculpa.
Disseste pela enésima vez que…gostavas de mim.
Foste o meu menino jesus.
Voltaste a negar.
Que fazer? – Não sei.
Foi talvez, só imaginado, ou aconteceu e foi demais?
A magia, porque magia do natal, veio verme. Creio que pela primeira vez.
Ali esteve a magia, a doçura, a distância ausente e presente.
Explicaste a ausência da presença, por feitio próprio.
Repetiste frases do xadrez.
Já me habituei com carinho, às migalhas da doçura que me deste.
Foi necessário vir o menino jesus para me dizer que a ave que há em ti precisa voar, que não tem ninho por perto, até porque, voar é preciso!
Precisas voar… e saltar…ao sol e em qualquer primavera…
O menino jesus mostrou-me o caminho.
Mas como é natal, eu gostei de saborear, salivar, degustar e digerir saudosamente, alegremente, felizmente as tuas migalhas, tamanho do pão do mundo, que me alimentaram desde o Verão.
Acho que, com as tuas migalhas, fiquei forte, robusta e leve. Assim também eu posso voar.
Vamos voar juntos?
Ainda que em sentidos e com sentidos distintos, quem sabe talvez um dia, como eu tremia, pensando que nos céus imaginários, nos encontremos na linha do horizonte da tua boca.
É dia de natal.
O meu coração sorri;
A minha boca sabe a mel;
As minhas mãos ainda estão quentes;
O meu olfacto detecta o teu cheiro;
Os meus olhos fechados vêem o brilho da lua e sentem o calor do sol.
Foste!?
Vai… Com muito amor
Obrigada menino Jesus.
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"Folha Caída"
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Não te quero

Não te quero senão porque te quero,
e de querer-te a não te querer chego,
e de esperar-te quando não te espero,
passa o meu coração do frio ao fogo.
Quero-te só porque a ti te quero,
Odeio-te sem fim e odiando te rogo,
e a medida do meu amor viajante,
é não te ver e amar-te,como um cego.
Tal vez consumirá a luz de Janeiro,
seu raio cruel meu coração inteiro,
roubando-me a chave do sossego,
nesta história só eu me morro,
e morrerei de amor porque te quero,
porque te quero amor,a sangue e fogo.
Nega-me o pão, o ar,a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,porque então morreria.
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"Pablo Neruda"
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