quarta-feira, 7 de outubro de 2009


Nostalgia


Hoje acordei sonhando. Chovia.
Hoje acordei poesia,
Hoje acordei desejando,
Hoje, a primeira gota de ar que respirei, foi passado.
Hoje está a chover…
A chuva causa-me nostalgia, ou seja, é o sentimento que sinto quando chove.
Mas é uma nostalgia doce, serena, suave, tranquila, melada…
Pergunto-me muitas vezes, quando chove, porque tenho esse sentimento.
Aí vem a questão.
Nostalgia está, para mim, associada a saudade.
Mas está só associada. (Porque comparar nostalgia com saudade é como comparar a beira da estrada com a estrada da beira (ahahaha)).
A saudade para mim é uma mistura de perdas, mas perdas recuperáveis, resgatáveis, restauráveis…
A nostalgia encerra uma sensação de saudade de um tempo ou de uma situação vivida, ou de uma pessoa.
Esta sensação é por vezes idealizada, irreal, florida, imaginária (não é por acaso que a nostalgia depende muito do estado de espírito).
A nostalgia, é portanto um sentimento associado à melancolia originada pela lembrança, dourada, mesclada, sonhada, que se sente pela ausência e que gostaríamos de voltar a reviver…, onde o velho se mistura com o novo.
A grande diferença entre a nostalgia e a saudade é que, enquanto a saudade em presença do ente saudoso, esvai-se, acalma-se, aquieta-se, atenua-se…, a nostalgia, em presença do ente nostálgico, não diminui, pelo contrário, alimenta-se do ente e fortalece-se, aumenta, cria mais raízes, mais alicerces, mais enlevos, mais sonhos clandestinos, mais necessidades…
A nostalgia é autofágica e quanto mais alimento se lhe dá, mais ela precisa…
Quem nunca se saciou com um perfume, um sabor, um gesto, uma cor, uma musica, uma palavra?

Quando te digo tenho saudade, deveria dizer... tenho nostalgia. Não seria mais correcto?
Sei que uma tarde qualquer de um dia dez qualquer, de um mês de Agosto qualquer, vindo de um lado qualquer, numa qualquer cidade de qualquer país, aparecerá numa praça qualquer, uma qualquer nostalgia, que me fará apagar a saudade ou uma qualquer saudade que me fará aumentar a nostalgia. Aí, quem sabe, me completarei.
-------------------------------------------------
"Folha Caída"
----------------------

Saudade

Saudade - O que será... não sei... procurei sabê-lo
em dicionários antigos e poeirentos
e noutros livros onde não achei o sentido
desta doce palavra de perfis ambíguos.
Dizem que azuis são as montanhas como ela,
que nela se obscurecem os amores longínquos,
e um bom e nobre amigo meu (e das estrelas)
a nomeia num tremor de cabelos e mãos.
Hoje em Eça de Queiroz sem cuidar a descubro,
seu segredo se evade, sua doçura me obceca
como uma mariposa de estranho e fino corpo
sempre longe - tão longe! - de minhas redes tranquilas.
Saudade... Oiça, vizinho, sabe o significado
desta palavra branca que se evade como um peixe?
Não... e me treme na boca seu tremor delicado...
Saudade...

----------------------------
"Pablo Neruda"

1 comentário:

Maria disse...

Só tu consegues transmitir-me o que muitas vezes quero entender e não consigo...

Gostei de te ler!

Adoro-te!

Um beijo nesse coração... Umas vezes nostalgico, outras nem tanto!