quinta-feira, 27 de novembro de 2008

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Maningando: O breve regresso

Este "pensamento" foi-me remetido e autorizada a sua inclusão, pelo meu amigo Carlos D.
Obrigada por partilhares comigo. Nota: Não consegui por a foto que acompanhava o texo, por isso puz uma minha. Peço desculpa.
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Depois de quase vinte anos de diáspora,
o grande pássaro africano transportou-me suavemente durante dez horas,
à terra que me viu nascer.
O primeiro dia, as primeiras horas,
revolveram-me a alma e as entranhas.
Adoeci por não te reconhecer.
Vi-te cidade decrépita, envelhecida - precocemente.
Estranhamente estranha,
Como que se nunca ali tivesse estado, como se nunca nos tivéssemos pertencido.
Quase desconhecidos.
Depois tu, cidade e os teus, foste-me envolvendo e abraçando,
como que recebendo um filho,
há muito tempo não visto - perdido talvez.
Minuto a minuto,
o teu rosto ganhou silhuetas conhecidas.
Voltaste a ser tu,
Voltei a ser eu.
O tempo foi muito curto, mas bastou.
Voltámos a pertencer-nos.
Triste voltei à diáspora,
na certeza de viver num lugar a que não pertenço.
Neste lugar de exílio, alegra-me saber que estás bem e que estarás melhor;
Alegra-me saber que estás aí,
pronta a receber-me com um imenso afecto de mãe.
Mãe África, afecto forte, mútuo, indestrutível.

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Lisboa, 10 de Maio de 2003

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

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Um "pedaço" do livro "O Historiador"
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(…) Ragusa, lá em baixo ao longe, uma cidade de marfim com um mar de ouro fundido, batido pelo sol, quebrando-se em torno dos seus paredões, telhados mais rubros que o céu do entardecer dentro de extraordinárias muralhas medievais.(…)
(…) Pelo meio da manhã seguinte estávamos sentados a uns trinta metros acima das ondas, que rebentavam e rugiam, brancas em torno das raízes gigantescas da cidade. (...)

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“O Histoiador” de Elizabeth Kostova

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

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Reinaldo Ferreira

"Nascido em Barcelona, a 20 de Março de 1922, Reinaldo Ferreira, de seu nome completo Reinaldo Edgar de Azevedo e Silva Ferreira, era filho do jornalista Reinaldo Ferreira, o celebrado Repórter X.
Tendo vindo para Moçambique (Lourenço Marques) em fins do ano de 1941 e aqui feito o sétimo ano dos liceus, por cá se conservou, com raras e breves escapadas à Metrópole, até Junho de 1959, data do seu falecimento.
Em Março do mesmo ano declara-se-lhe um cancro de pulmão que quase fulminantemente o arrebatou.
A pouco mais do que isso se resumirá a biografia de Reinaldo Ferreira, se por biografia entendermos o conjunto de acidentes que mais vulgarmente dão nas vistas. Biografia, portanto, como tantos, quase a não tem ou a tem predominantemente interior. Obra também a não deixou publicada e o melhor que se fez é o que agora aqui se publica. Por ironia do destino o que mais alargou as fronteiras do seu nome foi o que de menos valor ele nos legou: colaboração em algumas revistas musicais, letra de uma ou outra canção de grande êxito, teatro radiofónico, pouco mais. Sabe-se, sabem-no os amigos que com ele mais de perto privaram, que o teatro o seduzia: nele se ensaiara já, sendo certo que exista pelo menos o testemunho de uma (se não mais) sua incursão neste domínio. Muito seria quiçá de esperar neste capítulo, mas para tanto lhe foi pouca a vida."
(In Poemas, Introdução, Imprensa Nacional de Moçambique, Lourenço Marques, 1960)

Reinaldo Ferreira projectara publicar um livro, pouco antes de ser atingido pela doença que lhe trouxe a morte. Tal livro teria o título, já escolhido, de «Um voo cego a nada» e incluiria os poemas aqui reunidos que o autor separara em índices, alguns até já com subtítulos.Foi publicado após a sua morte.

NOTA: É um dos poetas de que mais gosto. Melhor dizendo, talvez porque marca uma época muito especial para mim, os seus poemas dizem-me muito. Alguns deles sei de cor... não é fácil para mim.
Aqui reproduzo alguns de que gosto muito.


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"Se eu nunca disse que os teus dentes"


Se eu nunca disse que os teus dentes
São pérolas,
É porque são dentes.
Se eu nunca disse que os teus lábios
São corais,
É porque são lábios.
Se eu nunca disse que os teus olhos
São d'ónix, ou esmeralda, ou safira,
É porque são olhos.
Pérolas e ónix e corais são coisas,
E coisas não sublimam coisas.
Eu, se algum dia com lugares-comuns
Houvesse de louvar-te,
Decerto buscava na poesia,
Na paisagem, na música,
Imagens transcendentes
Dos olhos e dos lábios e dos dentes.
Mas crê, sinceramente crê,
Que todas as metáforas são pouco
Para dizer o que eu vejo.
E vejo olhos, lábios, dentes.


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"Vivo na esperança de um gesto"

Vivo na esperança de um gesto
Que hás-de fazer.
Gesto, claro, é maneira de dizer,
Pois o que importa é o resto
Que esse gesto tem de ter.
Tem que ter sinceridade
Sem parecer premeditado;
E tem que ser convincente,
Mas de maneira diferente
Do discurso preparado.
Sem me alargar, não resisto
À tentação de dizer
Que o gesto não é só isto...
Quando tu, em confusão,
Sabendo que estou à espera,
Me mostras que só hesitas
Por não saber começar,
Que tentações de falar!
Porque enfim, como adivinhas,
Esse gesto eu sei qual é,
Mas se o disser, já não é...


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"O essencial é ter o vento"

O essencial é ter o vento.

Compra-o; compra-o depressa,
A qualquer preço.
Dá por ele um princípio, uma ideia,
Uma dúzia ou mesmo dúzia e meia
Dos teus melhores amigos, mas compra-o.
Outros, menos sagazes
E mais convencionais,
Te dirão que o preciso, o urgente,
É ser o jogador mais influente
Dum trust de petróleo ou de carvão.
Eu não:
O essencial é ter o vento.
E agora que o Outono se insinua
No cadáver das folhas
Que atapeta a rua
E o grande vento afina a voz
Para requiem do Verão,
A baixa é certa.
Compra-o; mas compra-o todo,
De modo
Que não fique sopro ou brisa
Nas mãos de um concorrente
Incompetente.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

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Gentilmente me foi dedicado por um grande amigo.
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"Estamos no Outono, as árvores resolvem despojar-se de folhas,como que fartas e abafadas do calor do verão.
Mas antes, como que a premiá-las,mudam-lhes a cor para um tom sereno, sábio e belo, de quem já viu tudo.
Há no chão imensas folhas caídas. Nos ramos das árvores que se despem ainda mais por cair.
É Outono, e a natureza presenteia-nos com folhas confettis, como que no apogeu duma festa majestática.
Celebremos então cada folha caída em jeito de dia último das nossas vidas;No fim do Outono seremos então todos mais felizes."

Feito agora e dedicado a ti. Não sei se gostas da improvisação.
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Carlos D.

domingo, 9 de novembro de 2008

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Épicuro
Nascimento: 341 a. C.
Falecimento:
270 a. C.
Escola/tradição: Fundador do
Epicurismo
Principais interesses:
Hedonismo, Atomismo
Idéias notáveis:
Epicurismo
Influenciados:
Hermarchus, Lucretius, Thomas Hobbes, Jeremy Bentham, J. S. Mill, Thomas Jefferson, Friedrich Nietzsche, Karl Marx, Michel Onfray, Hadrian, Metrodorus of Lampsacus (the younger), Philodemus, Amafinius, Catius
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"Filosofar é Preciso"
Na juventude, não devemos hesitar em filosofar; na velhice, não devemos deixar de filosofar. Nunca é cedo nem tarde demais para cuidar da própria alma. Quem diz que não é ainda, ou já não é mais, tempo de filosofar, parece-se ao que diz que não é ainda, ou já não é mais, tempo de ser feliz. Jovens ou velhos, devemos sempre filosofar; no último caso, para rejuvenescermos ao contacto do bem, pela lembrança dos dias passados, e no primeiro, para sermos, embora jovens, tão firmes quanto um ancião diante do futuro. É mister, pois, estudar os meios de adquirir a felicidade; quando a temos, temos tudo; quando a não temos, fazemos tudo por adquiri-la.
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Epicuro, in "A Conduta na Vida"
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Ralph Emerson
25 de maio de 1803, Boston, Massachusetts, EUA
27 de abril de 1882, Concord, Massachusettes
Foi um famoso escritor, filósofo e poeta dos Estados Unidos da América.
Desenvolveu a sua filosofia "transcendentalista", exposta em obras como Natureza, Ensaios e Sociedade e solidão.
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"A Arte de Citar"
Bem ao lado do criador de uma grande frase figura aquele a quem primeiro ocorre citá-la. Muitos lerão um livro antes que alguém pense em citar certa passagem. Mas, assim que isso é feito, aquela linha será citada de leste a oeste. [...] De facto, é tão difícil nos apropriarmos dos pensamentos dos outros como inventá-los. Pois sempre alguma transição abrupta, alguma mudança repentina de temperatura ou de ponto de vista trai a inserção do alheio.
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Ralph Waldo Emerson, in "Quotation and Originality"
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PLATÃO
Nascimento: 428/27 a.C.Atenas
Falecimento:
347 a.C.Atenas
Ocupação:
Filósofo
Escola/tradição:
Platonismo
Principais interesses:
Retórica, Arte, Literatura, Epistemologia, Justiça, Virtude, Política, Educação, Militarismo, Filosofia
Influências:
Sócrates, Homero, Hesíodo, Aristófanes, Protágoras de Abdera, Parmênides, Pitágoras, Heráclito, Orfismo
Influenciados:
Aristóteles, Neoplatonismo, Cícero, Plutarco, Estoicismo, Descartes, Hobbes, Leibniz, Newton, Mill, Schopenhauer, Nietzsche, Heidegger, Anselmo de Cantuária, Gadamer e inúmeros outros filosófos e teólogos.

Discípulo de
Sócrates, fundador da Academia e mestre de Aristóteles. Acredita-se que seu nome verdadeiro tenha sido Arístocles; Platão era um apelido que, provavelmente, fazia referência à sua caracteristica física, tal como o porte atlético ou os ombros largos, ou ainda a sua ampla capacidade intelectual de tratar de diferentes temas. Πλάτος (plátos) em grego significa amplitude, dimensão, largura. Sua filosofia é de grande importância e influência. Platão ocupou-se com vários temas, entre eles ética, política, metafísica e teoria do conhecimento.
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"Escrita e Interpretação "
Sócrates: Você sabe, Fedro, esta é a singularidade do escrever, que o torna verdadeiramente análogo ao pintar. As obras de um pintor mostram-se a nós como se estivessem vivas; mas, se as questionamos, elas mantêm o mais altivo silêncio. O mesmo se dá com as palavras escritas: parecem falar conosco como se fossem inteligentes, mas, se lhes perguntamos qualquer coisa com respeito ao que dizem, por desejarmos ser instruídos, elas continuam para sempre a nos dizer exactamente a mesma coisa. E, uma vez que algo foi escrito, a composição, seja qual for, espalha-se por toda a parte, caindo em mãos não só dos que a compreendem mas também dos que não têm relação alguma com ela; não sabe como se dirigir às pessoas certas e não se dirigir às erradas. E, quando é maltratada ou injustamente ultrajada, precisa sempre que o seu pai lhe venha em socorro, sendo incapaz de se defender ou de cuidar de si própria.
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Platão, in 'Fedro'
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FRIEDRICH NIETZSCHE

Nascimento: 15 de Outubro de 1844 Röcken, Alemanha
Falecimento:
25 de Agosto de 1900 (55 anos)Weimar,
Nacionalidade: Alemã
Ocupação:Filósofo, filólogo
Escola/tradição:
Filosofia continental, Romantismo
Principais interesses:
Epistemologia, Ética, Ontologia, Filosofia da história, Psicologia
Idéias notáveis:
Morte de Deus, Vontade de Poder, Eterno retorno, Super-Homem, Perspectivismo, Apolíneo e Dionisíaco
Influências:
Heráclito, Platão, Montaigne, Spinoza, Kant, Goethe, Schiller, Schopenhauer, Heine, Emerson, Poe, Wagner,Dostoiévski Influenciados: Rilke, Jung, Iqbal, Jaspers, Heidegger, Bataille, Rand, Sartre, Camus, Deleuze, Foucault, Derrida, Sigmund Freud
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"O Que se Pode Prometer"
Pode-se prometer acções, mas não sentimentos, pois estes são involuntários. Quem promete a alguém amá-lo sempre, ou odiá-lo sempre, ou ser-lhe sempre fiel, promete algo que não está em seu poder; mas o que pode perfeitamente prometer são aquelas acções que, na verdade, são geralmente as consequências do amor, do ódio, da fidelidade, mas que também podem emanar de outras razões, pois a uma acção conduzem diversos caminhos e motivos. A promessa de amar sempre alguém significa, portanto: enquanto eu te amar, manifestar-te-ei as acções do amor; se eu já não te amar, pois, não obstante, receberás para sempre de mim as mesmas acções, ainda que por outros motivos. De modo que a aparência de que o amor estaria inalterado e continuaria sendo o mesmo permanece na cabeça das outras pessoas. Promete-se, por conseguinte, a persistência da aparência do amor, quando, sem ilusão, se promete a alguém amor perpétuo.
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Friedrich Nietzsche, in 'Humano, Demasiado Humano'

sábado, 8 de novembro de 2008

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VINÍCIUS DE MORAIS

A maior solidão é a do ser que não ama.
A maior solidão é a dor do ser que se ausenta, que se defende, que se fecha, que se recusa a participar da vida humana.
A maior solidão é a do homem encerrado em si mesmo, no absoluto de si mesmo,
o que não dá a quem pede o que ele pode dar de amor, de amizade, de socorro.
O maior solitário é o que tem medo de amar, o que tem medo de ferir e ferir-se,
o ser casto da mulher, do amigo, do povo, do mundo.
Esse queima como uma lâmpada triste, cujo reflexo entristece também tudo em torno.
Ele é a angústia do mundo que o reflete.
Ele é o que se recusa às verdadeiras fontes de emoção, as que são o patrimônio de todos, e, encerrado em seu duro privilégio, semeia pedras do alto de sua fria e desolada torre.
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Vinícius de Morais
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VICTOR HUGO

Desejo primeiro que você ame,
E que amando, também seja amado.
E que se não for, seja breve em esquecer.
E que esquecendo, não guarde mágoa.
Desejo, pois, que não seja assim,
Mas se for, saiba ser sem desesperar.
Desejo também que tenha amigos,
Que mesmo maus e inconseqüentes,
Sejam corajosos e fiéis,
E que pelo menos num deles
Você possa confiar sem duvidar.
E porque a vida é assim,
Desejo ainda que você tenha inimigos.
Nem muitos, nem poucos,
Mas na medida exata para que, algumas vezes,
Você se interpele a respeito
De suas próprias certezas.
E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo,
Para que você não se sinta demasiado seguro.
Desejo depois que você seja útil,
Mas não insubstituível.
E que nos maus momentos,
Quando não restar mais nada,
Essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.
Desejo ainda que você seja tolerante,
Não com os que erram pouco, porque isso é fácil,
Mas com os que erram muito e irremediavelmente,
E que fazendo bom uso dessa tolerância,
Você sirva de exemplo aos outros.
Desejo que você, sendo jovem,
Não amadureça depressa demais,
E que sendo maduro, não insista em rejuvenescer
E que sendo velho, não se dedique ao desespero.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e
É preciso deixar que eles escorram por entre nós.
Desejo por sinal que você seja triste,
Não o ano todo, mas apenas um dia.
Mas que nesse dia descubra
Que o riso diário é bom,
O riso habitual é insosso e o riso constante é insano.
Desejo que você descubra ,
Com o máximo de urgência,
Acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos,
Injustiçados e infelizes, e que estão à sua volta.
Desejo ainda que você afague um gato,
Alimente um cuco e ouça o joão-de-barro
Erguer triunfante o seu canto matinal
Porque, assim, você sesentirá bem por nada.
Desejo também que você plante uma semente,
Por mais minúscula que seja,
E acompanhe o seu crescimento,
Para que você saiba de quantas
Muitas vidas é feita uma árvore.
Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro,
Porque é preciso ser prático.
Eque pelo menos uma vez por ano
Coloque um pouco dele
Na sua frente e diga `Isso é meu`,
Só para que fique bem claro quem é o dono dequem.
Desejo também que nenhum de seus afetos morra,
Por ele e por você,
Mas que se morrer, você possa chorar
Sem se lamentar e sofrer sem se culpar.
Desejo por fim que você sendo homem,
Tenha uma boa mulher,
E que sendo mulher,
Tenha um bom homem
E que se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes,
E quando estiverem exaustos e sorridentes,
Ainda haja amor para recomeçar.
E se tudo isso acontecer,
Não tenho mais nada a te desejar.
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Victor Hugo
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"SONETO DA ÁRVORE MORTA"
Que árvore frondosa! Assim, notória,
Dava frutos, ah! Sempre no verão!
E fez parte da minha breve história
E sempre altissonante em emoção!
Naquele recanto, sim era a glória.
Bonita de estação sobre estação,
Que nunca saiu da fugaz memória
Era a maioral, forte desde então,
Quando uma néscia lâmina que corta
Transforma a tal vida em matéria morta
Um homem a desfez sem compaixão...
Pobre árvore. Pobre também de mim...
Essa história passara a ser ruim
Sendo um exemplo atroz de destruição!
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Claudio Sousa Pereira
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VINÍCIUS DE MORAIS
"INFINITO PARA SEMPRE"
Amizade...
Amor...
Poesia...


Um pouco do amado poetinha
Vinícius de Moraes.

"Infinito para sempre!”

Procura-se Um Amigo
Vinícius de Moraes



Não precisa ser homem, basta ser humano,
basta ter sentimentos,basta ter coração.
Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir.
Tem que gostar de poesia, de madrugada,
de pássaro, de sol, da lua, do canto,
dos ventos e das canções da brisa.
Deve ter amor,
um grande amor
por alguém,
ou então sentir falta
de não ter esse amor.
Deve amar o próximo
e respeitar a dor
que os passantes
levam consigo.
Deve guardar segredo
sem se sacrificar.
Não é preciso que seja de primeira mão,
nem é imprescindível que seja de segunda mão.
Pode já ter sido enganado,
pois todos os amigos são enganados.
Não é preciso que seja puro,
nem que seja todo impuro,
mas não deve ser vulgar.
Deve ter um ideal
e medo de perdê-lo e,
no caso de assim não ser,
deve sentir o grande
vácuo que isso deixa.
Tem que ter ressonâncias humanas,
seu principal objetivo deve ser o de amigo.
Deve sentir pena
das pessoas tristes
e compreender
o imenso vazio
dos solitários.
Deve gostar de crianças
e lastimar as que
não puderam nascer.
Procura-se um amigo
para gostar dos mesmos gostos,
que se comova, quando chamado de amigo.
Que saiba
conversar
de coisas simples,
de orvalhos,
de grandes chuvas
e das recordações
de infância.
Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer,
para contar o que se viu de belo e triste durante o dia,
dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade.
Deve gostar de ruas desertas,
de poças de água
e de caminhos molhados,
de beira de estrada,
de mato depois da chuva,
de se deitar no capim.
Precisa-se de um amigo
que diga que vale a pena viver,
não porque a vida é bela,
mas porque já se tem um amigo.
Para não se viver
debruçado no passado
em busca de
memórias perdidas.
Precisa-se de um amigo
para se parar de chorar.
Que nos bata nos ombros
sorrindo ou chorando,mas que
nos chame de amigo,
para ter-se a consciência
de que ainda se vive.

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Vinícius de Moraes
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O MEU BÉBÉ

Fui a pessoa mais infeliz do mundo e depois a mais feliz.
Felizmente ficou a segunda.....
Morri e voltei a nascer.
O sol pôs-se, mal nasceu, e só voltou a nascer ao fim da manhã.
Não havia sequer vento para me abanar e acordar...
O tempo não passava... Ou passava rápido demais... não sei...
O vento não me veio roubar as gotas de água, ou melhor a enchurrada que dos meus olhos saía.
A chuva não veio, por fim, lavar a minha face cansada, vermelha, erugada, nem os meus olhos tristes e cansados.
Mas eu consegui tudo isso, poque o tempo, a chuva e o vento são meus amigos e como forças da naureza que são, sabem que eu mereço que passem por mim e me acariciem. Estava bem precisando!!!
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Folha Caída
2008/10/25

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A CHUVA

Ela é minha companheira e amiga.
Ela aquece-me quando tenho frio.
Ela tempera-me quando tenho calor.
Quando estou triste ela alegra-me
Quando estou alegre ela alegra-me ainda mais.

Ela, o vento e o tempo são meus companheiros.
Ajudam-me a pensar, a sentir, a rir, a chorar...
São eles que me fazem companhia.
Por isso são meus.
É o meu vento, a minha chuva e o meu tempo.
Só nós nos entendemos.
Só eu os entendo e só eles me entendem.

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Folha Caída

23.10.2008

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QUARTA-FEIRA


Tudo fazia crer que seria um dia interessante.
É quarta-feira.
O céu está nublado, por vezes com chuviscos aqui e ali.
Não está frio, a temperatura está amena. Tudo fazia crer que seria um dia interessante.
O sol brilha, escondendo-se de vez em quando atrás de um novelo de lã cinzenta.
Mas assim mesmo, tudo fazia crer que seria um dia interessante.
São três e meia, tudo faz crer que será uma tarde interessante.
São quatro e… tudo faz crer que será uma tarde interessante.
São cinco horas.
Se fosse diferente, ainda tudo poderia fazer querer que fosse uma tarde interessante.
Mas não foi diferente…
Instala-se a dúvida, o nervoso, a conversa sem conteúdo, as banalidades, o dia-a-dia, as futilidades…
Sabe-se que esse estado de espírito não leva a um fim interessante, mas, deixa-se que ele se instale, porque,
Não sei se tudo fazia querer que seria uma tarde interessante.
Culpa?
De quem?
Porquê?
Com que objectivo?
Qual é o fim?
Para onde vamos?
Há resposta?
Eu não tenho.
Mas tudo fazia crer que seria uma tarde interessante.
Há toda uma caminhada pela frente.
Os silêncios instalam-se e são quebrados por mais banalidades. Não há nada a dizer.
Mas ainda tudo fazia crer que seria uma tarde interessante.
Para onde vamos?
Com que objectivo?
Qual o fim?
Isto eu sei!
Mas também sei que tudo fazia crer que seria uma tarde interessante.
Sei ainda que nem tudo fazia querer que fosse uma tarde interessante.
A resposta não se fez esperar.
A lado nenhum.
Outro que não o confessado.
Qual o fim?
Mais tarde se saberá.
Por entre o embaraço e a frescura da noite que se aproxima, vem um café.
Para onde vamos?
A lado nenhum.
Só há tempo para um pequeno passeio, por entre as árvores e os labirintos dos riachos.
Ouve-se a água correr com tanta destreza como os pensamentos na cabeça de cada um.
Adivinha-se no leito daqueles riachos os seixos já cansados de tanto rolar.
Por isso fervilha a água que corre?
Por isso fervilham os pensamentos?
Ena!
- Tanta água!
- Por baixo daquela inda há mais.
Que energia tamanha é necessária para tanto fervilhar.
Tal fervilhar somente acalma quando mais um conjunto de banalidades é proferido e vem novamente o silêncio cortado pelo fervilhar… da água e do pensamento.
Tudo fazia crer que poderia ter sido uma tarde interessante.
Tudo fez querer que não fosse uma tarde interessante.
É noite.
Tudo fazia crer que seria uma noite interessante.
O interesse é medido pela capacidade de enriquecimento.
Se não se pode tomar um banho de emersão, porque não tomar um duche?
Mas…
Para decidir entre o banho e o duche tem que haver atitude.
Porque não há atitude?
Saberei?
Não. Sim. Talvez. Estarei certa? Estarei errada?
Não sei.
Tudo fazia crer que ainda poderia ser uma noite interessante.
Haverá possibilidade de tomar atitude se o medo assenta e marca posição?
Não creio. O medo pulula em todas as atitudes e em todos os sons. Ele está ali, latente.
Mas medo de quê?
Medo de assumir que esgotandas as banalidades nada mais há por dizer?
Então que estou eu a fazer aqui?
Então, tudo fazia querer que não fosse uma noite interessante!
Até onde vai a minha ânsia de conhecimento e enriquecimento?
Nada mais há para dizer além das frases de lugar comum?
Não há troca de ideias que não sejam todas, menos aquelas que interessam?
Medo?
Mas de quê?
E de quem?
É das respostas?
É das perguntas?
Ou não há já sequer lugar para tanto?
Tudo fazia crer que seria um dia, uma tarde e uma noite interessantes.
Mas tudo fez querer que fosse um dia, uma tarde e uma noite desinteressantes.

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05.11.08

Folha Caída