sexta-feira, 27 de novembro de 2009


Queres namorar comigo ontem?


As emoções foram durante muito tempo matéria da psicologia, encaradas como psicobiológicas, dadas à priori.
Durkheim e Simmel ressaltaram o seu carácter social e segundo alguns autores, somente a partir da década de 80 é que as emoções passam a tomar lugar no campo das ciências sociais, em particular na área da antropologia, a chamada antropologia das emoções.
Queres namorar comigo ontem?

Durkheim, aborda a dimensão social das emoções partindo de estudos sobre o fenómeno religioso e das suas representações colectivas, que dão origem à manutenção do consenso social e à unidade da sociedade. Já Simmel aborda as emoções estudando os fenómenos da fidelidade, da gratidão e do amor, onde afirma que estes fenómenos surgem da interacção entre os indivíduos, que adquirem status social porque articulam com as formas de relações.
No entanto, é com Mauss que se desenvolve a constituição das emoções como facto social e em que este afirma que “só há comunicação humana através de símbolos, de sinais comuns, permanentes, exteriores aos estados mentais individuais que simplesmente são sucessivos, através de sinais de grupos de estados considerados a seguir como realidades". Mauss defende que as emoções formam uma linguagem, ou seja um conjunto de signos de expressão, que em muitas vezes leva a manifestações obrigatórias (morte/ritos fúnebres, namoro/casamento).
Estes e outros estudos e autores motivam em mim a teoria de que, as emoções, sendo também psicobiologicas, têm um grande cariz social, com um grande porte cultural.
Assim, há necessidade de se perceber a linguagem das emoções, como elemento de comunicação, e de interacção social e cultural.
Queres namorar comigo ontem?

Parto desta ingénua e acientífica abordagem, para escrever o que me vai no pensamento sobre a amizade, e em alguns casos, como ela conflui para o namoro, hoje que, namoro tomou conceitos, perspectivas, espaços, lugares, meios de contacto… tão distintos da era onde a nova tecnologia estava ausente.
A palavra "amizade" em português refere-se tanto a um sentimento quanto a uma relação específica. Segundo o dicionário Aurélio, esse sentimento engloba outros, como afeição, simpatia e ternura, e pode, assim, estar presente em relações que não são caracterizadas como de amizade.
Já no dicionário inglês Oxford, encontramos uma definição mais restrita da categoria, que se refere apenas à relação entre amigos ou ao sentimento associado a essa relação específica.
Embora sejam definições formais de dicionários, esses significados apontam para elaborações culturais particulares, mostrando como o conceito de amizade pode diferir de sociedade para sociedade, de cultura para cultura, de religião para religião…
Recorrendo ainda à sociologia (Allan, Paine e Suttles), amizade é vista em geral como uma relação afectiva e voluntária, que envolve práticas de sociabilidade, trocas íntimas e ajuda mútua, e necessita de algum grau de equivalência ou igualdade entre amigos. Nesta discussão, a amizade é alocada estritamente no domínio privado da vida social.
Mas, (Bell, Coleman, Papataxiarchis e Silver) mostram-nos como os significados da amizade em contextos históricos e culturais distintos vão realçar ou eclipsar esses termos, que, por sua vez, se mostram entrelaçados com uma forma especificamente ocidental e moderna de pensar a pessoa e sua relação com os outros.
Queres namorar comigo ontem?

No dicionário Aurélio, namoro é definido como uma instituição de relacionamento interpessoal não moderna, que tem como função a experimentação sentimental ou sexual entre duas pessoas através da troca de conhecimentos e uma vivência com um grau de comprometimento inferior à do matrimónio.
A grande maioria utiliza o namoro como pré-condição para o estabelecimento de um noivado ou casamento definido este último acto antropologicamente como um vínculo estabelecido entre duas pessoas, mediante o reconhecimento governamental, religioso ou social.
Queres namorar comigo ontem?

Para um católico que pretenda casar, o namoro pode ser visto como uma relação que permite avaliar a adequação do outro como parceiro, a fim de, com ele, vir a constituir uma união indissolúvel de corpo e alma. Portanto um namoro não se limita a ser uma possibilidade de fruição de prazer, mas é um empreendimento espiritualmente importante que permitirá, ou não, dar origem a um sacramento instituído por Deus, o matrimónio.
Queres namorar comigo ontem?

Entre os protestantes, namoro descompromissado, históricamente, não é bem visto, por atentar contra suas doutrinas originais, que solicitam pureza moral e abstinência sexual antes do casamento. Porém, no mundo pós-moderno, a proliferação da ideia de verdade relativa, tem sido aceite neste meio, o que promoveu uma maior liberdade sexual no compromisso do namoro, havendo até casos em que os parceiros dividem o mesmo lar sem a oficialização do relacionamento diante da Igreja.
Queres namorar comigo ontem?
Entre os evangélicos, devido à ideia de retorno às origens do cristianismo, e à sua pureza inicial, ideia esta que promoveu o surgimento das denominações chamadas evangélicas, os seus teólogos tem discutido a necessidade da existência, actualmente, deste nível de relacionamento pré-conjugal quando, na própria cultura hebraica (povo cuja cultura moral foi o berço do cristianismo) o namoro nunca existiu, ou sequer foi citado.
Queres namorar comigo ontem?

Segundo a tradição hebraica, mesmo que a um homem, não fosse possível serem os seus pais a escolher o cônjuge (o que era preferencial), e fosse necessário que ele mesmo fizesse essa escolha, a ele só seria lícito comprometer-se em noivado com (se prometer para) uma mulher, aos pais, ou responsáveis dela. Neste compromisso, qualquer envolvimento sexual ou afectivo com outra mulher que não a noiva já implicava uma traição. Mas também, não era permitido qualquer contacto sexual, em nenhuma intensidade, com a noiva. Em alguns casos nem sequer o desenvolvimento de uma amizade, pois até esta deveria acontecer apenas no casamento.
Por tudo isto, pergunto:


Queres namorar comigo ontem?

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"Folha Caída"
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Eu não existo sem você

Eu sei e você sabe, já que a vida quis assim
Que nada nesse mundo levará você de mim
Eu sei e você sabe que a distância não existe
Que todo grande amor
Só é bem grande se for triste
Por isso, meu amor
Não tenha medo de sofrer
Que todos os caminhos
Me encaminham pra você
Assim como o oceano
Só é belo com luar
Assim como a canção
Só tem razão se se cantar
Assim como uma nuvem
Só acontece se chover
Assim como o poeta
Só é grande se sofrer
Assim como viver
Sem ter amor não é viver
Não há você sem mim
Eu não existo sem você
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"Vinicius de Morais"
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1 comentário:

Folha Caída disse...

Quinta da Ribeira disse...
Grande texto; veloz e escorreito.
Agora sim, fiquei deslumbrado.Mulher sensivel, mas que ainda procura a razão cientifica(sociologica/antropológica), das coisas simples.
É um esforço penoso,que segundo disse Claude Lévi-Strauss à dias, antes de morrer, faz muito mal à garganta e dà estados de prostação.

3 de Dezembro de 2009 18:51